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Brasil

Genocídio dos yanomamis deriva da visão de progresso contínuo, acelerado e incontornável

Pode-se sugerir que a Imprensa foi a primeira a chegar atrasada? O jornalismo está muito focado em Brasília e se esquecendo da diversidade do país

Publicada em 04/02/23 às 18:39h - 10 visualizações

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Genocídio dos yanomamis deriva da visão de progresso contínuo, acelerado e incontornável
Avatar photo Euler de França Belém 29 janeiro 2023 às 00h10  (Foto: Rádio RIR Brasil Goiânia - Direção: Ronaldo Castro - e Marcio Fernandes 62 99951- 6976)

A imprensa não tem nenhuma responsabilidade pela subnutrição e pelas mortes de yanomamis. Já o finado governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, do indefectível PL, é um dos culpados pelo agravamento do problema, sobretudo porque escancarou as portas para a entrada e permanência de garimpeiros de ouro nas terras indígenas (traficantes de drogas também estão na região, aproveitando-se da omissão do Estado). Governantes estaduais, como o de Roraima, alegando que a jurisdição é do governo federal, não demonstraram nenhuma preocupação humanista.

Yanomamis subnutridos: descaso do Estado e da sociedade | Foto: Reprodução

Se os yanomamis estão morrendo, numa espécie de genocídio nem tão disfarçado assim, e se o problema não é recente, cadê as grandes reportagens da imprensa brasileira? Cadê a atenção redobrada dos editores dos jornais, como “Folha de S. Paulo”, “Estadão” e “O Globo”, das revistas “Veja”, “CartaCapital” e “IstoÉ” e das redes de televisão, como a Globo, Record e Band? Cadê os yanomamis na capa da “Veja” ou dos jornais citados antes da crise se tornar, digamos, nacional e, até, internacional?

Preocupada com a política e a economia — as ditas grandes questões —, a imprensa tem se descuidado de cobrir de maneira mais ampla a sociedade. Os indígenas são até “defendidos”, quase sempre em artigos, mas raramente os jornais, revistas e emissoras de televisão investem em reportagens amplas, feitas no local, e não apenas ouvindo autoridades e, eventualmente, lideranças dos povos originários.

Marcelo Leite: problema não é recente, mas agravou-se | Foto: Reprodução

A visão economicista do mundo — não há frase tão estúpida como “É a economia, estúpido”, mas se tornou aforismo para abertura de artigos e, até, de reportagens —, a ideia de progresso incontornável, é amplamente excludente das vozes dissonantes. Os indígenas, que ajudam a preservar as florestas, são, sugerem os apóstolos do progresso — filhos fossilizados do positivismo —, “barreiras” para o crescimento da economia. Fala-se muito em Bolsonaro, que não é um estadista — é um mero populista de direita que o descenso do PT produziu entre 2016 e 2018 —, mas quase nunca se menciona o ex-ministro da Economia Paulo Guedes, este, mais do que o presidente, o verdadeiro apologista do crescimento a qualquer custo.

Ailton Krenak: país não deve olhar somente para o 8 de Janeiro | Foto: Reprodução

Paulo Guedes pode até não dizer bobagens chocantes como Ricardo Salles e Bolsonaro, mas seu projeto de economia é o de exploração em alta escala, e rapidamente, dos recursos minerais e outros do país. A tese é: vamos arrancar tudo do solo, pois assim o Brasil se instalará entre os grandes (Estados Unidos, China, Japão e Alemanha) no concerto global. A visão está mais disseminada e assentada do que se acredita, e não é defendida tão-somente por Paulo Guedes e Jair Messas. Direita, esquerda e centro são seus apóstolos. O que distingue a esquerda petista — que não é comunista — é a pegada, digamos, humanista. O que é positivo, e muito.

Se no governo Bolsonaro prevaleceu a visão economicista — a economia é tudo, portanto aquilo que atrapalha o dito progresso precisa ser eliminado, caso dos munduruku, yanomamis e caiapó —, a imprensa submeteu-se à pauta dominante, que era do bolsonarismo e não dela (nem da sociedade), e deixou os outros Brasis de lado, esquecidos. Por isso, os indígenas não saíram nas manchetes dos jornais e nas capas das revistas há mais tempo.

Davi Kopenawa, xamã yanomami | Foto: Victor Moruyama/ISA

O jornalismo está se tornando uma atividade de gabinete? Não inteiramente. Mas a ideia de que se pode fazer quase tudo a partir da redação, sem contatos humanos, está contribuindo para distanciar os repórteres das questões-chaves da sociedade. Imagine se a “Folha de S. Paulo” enviasse um profissional do gabarito de Ricardo Kotscho para verificar a situação dos yanomamis, entre outros povos. Se fosse produzida uma série de reportagens, como aquelas que ele fez em Serra Pelada, o país teria voltado sua atenção para as dificuldades dos indígenas mais cedo, o que poderia ter salvado vidas.

Por que o governo Bolsonaro reinou quase absoluto, abrindo as porteiras para as diversas “boiadas”? Porque conseguiu, com certa habilidade, pautar a Imprensa, submetendo seu “discurso” — mesmo quando crítico — às parcas ideias bolsonaristas. Ao cobrir Brasília com extrema atenção, com seus melhores profissionais — que, naturalmente, apreciam os gabinetes refrigerados (e quem não gosta? Daqui a pouco, para retirar um repórter das áreas de conforto, será preciso usar um guindaste) —, a Imprensa patropi está, de alguma maneira, deixando o Brasil de lado. E nem se trata de cobrir o Brasil profundo, e sim o país que está aí, à espera de ser mostrado. Gritando para ser exibido, com seus problemas e, às vezes, soluções.

Ricardo Kotscho: um dos repórteres mais notáveis do país | Foto: Juliano Moreira

Um dos melhores repórteres e articulistas de ciência do país, Marcelo Leite, publicou, na “Folha de S. Paulo”, um artigo, “Genocídio yanomami é obra coletiva do Brasil”, que vale breve comentário, tal sua pertinência. De cara, nota que a divulgação dos problemas dos yanomamis se deu na revista “Sumaúma”. A publicação “revelou que 570 curumins yanomamis tinham morrido por causas evitáveis nos quatro anos de Bolsonaro. (…) Um surto de cobertura jornalística assomou para exibir o que era uma realidade crônica. (…) No quadriênio anterior a Bolsonaro, morreram uns 442 curumins nas terras assediadas pelo garimpo contaminador. (…) O genocídio começou muito antes. É coisa nossa”.

O governo de Bolsonaro agravou o problema, porque deu uma espécie de salvo-conduto aos garimpeiros — agentes da visão economicista, quer dizer, do crescimento econômico a todo vapor (que às vezes e muitas vezes não gera desenvolvimento). Mas o problema existia antes do presidente da direita. Marcelo Leite lembra que, no início da década de 1990, houve uma “matança de yanomamis, a de Haximu”.

Jair Bolsonaro e Ricardo Salles: a ideia hegemônica era “passar a boiada” | Foto: Reprodução

O repórter Ruan de Sousa Gabriel, de “O Globo”, entrevistou o escritor e líder indígena Ailton Krenak.

“A terra dos yanomamis é como um acampamento na escuridão. Quando um raio cai e produz um clarão, a opinião pública olha para lá e vê os yanomamis morrendo. Dura o tempo de um relâmpago. O território já estava invadido nos anos 1980. Os garimpeiros foram expulsos no governo Collor, mas voltaram. Tem mais de 20 mil garimpeiros lá. (…) O que eles [Bolsonaro, Hamilton Mourão] fizeram enquanto os yanomamis morriam envenenados pelo mercúrio? Os algozes dos yanomamis têm nome, e alguns continuam ocupando cargos públicos”, denuncia, de maneira tão bela quanto incisiva, o notável Ailton Krenak.

Ailton Krenak diz uma coisa que nós, da Imprensa, talvez não queiramos ouvir e ler: “O que está acontecendo na terra dos yanomamis é tão grave quanto o que ocorreu em 8 de janeiro. É o Brasil tentando se autoimolar. Do mesmo jeito que estão atrás dos invasores das sedes dos Três Poderes e de seus financiadores, é preciso ir atrás de invasores de terra indígena e financiadores do garimpo. Os yanomamis precisam ser contados no rol da Humanidade”. Não se trata de esquecer o 8 de janeiro, a tentativa de “abolir” a democracia, e sim de incluir outras pautas, tornando assuntos de discussão na sociedade. A Imprensa precisa “forçar” o país a prestar atenção na história e na vida atual dos povos originários.

Fernando Gabeira: seu alerta não serviu nem para a empresa onde trabalha | Foto: Reprodução

O xamã Davi Kopenawa, líder yanomami, disse aos repórteres Carolina Moraes e João Gabrel, da “Folha de S. Paulo”: “Em 2020, começaram aumentar as invasões na Terra Yanomami. A Associação Hutukara fazia documentos avisando sobre o aumento de garimpeiros. A gente pedia para a Funai, para retirarem [eles da terra], mas não fizeram nada. E aumentou ainda mais”.

Davi Kopenawa sublinha que “os yanomamis nunca morreram de fome. Estou aqui, tenho 66 anos e quando era pequeno, ninguém morria de fome. Agora o garimpo está matando o meu povo e também os parentes munduruku e caiapó. Quando os indígenas ficam doentes, eles não conseguem trabalhar [na roça] ou caçar”.

Konstantinos Kaváfis: poeta grego

A ideia de “progresso”, tão cara à direita e à esquerda — quer dizer, uma visão de mundo “modernizadora” —, é predatória. Talvez devêssemos ler e pensar sobre o que diz Ailton Krenak: “A narrativa colonial se apoia em um conjunto de consensos, como a ideia do futuro como algo prospectivo, que ainda vamos alcançar. É pura ficção. Se você perguntar para um yanomami o que vai fazer no futuro, ele vai te responder: ‘Onde é isso?’. (…) O conceito indígena de futuro está articulado à ancestralidade porque tudo que existe é o passado, o que já aconteceu. O futuro é ancestral porque está sendo produzido agora. (…) O futuro não é uma flecha movida para a frente. O futuro está aqui, agora, em todo lugar”. Trata-se de uma ideia filosófica que, por certo, encantaria Isaiah Berlin. O filósofo anglo-letão desconfiava dos que sacrificavam o presente, destruindo o mundo e matando pessoas, em busca de um futuro radioso que, a rigor, não chega.

A denúncia do errático e nefasto Bolsonaro precisa ser feita, porque é correta, mas o país não começou a “abandonar” e “matar” os povos originários entre 2019 e 2022. O genocídio é (muito) mais antigo. E, mesmo sem o bolsonarismo, parte dos problemas certamente continuará. Porque o modo de os indígenas viverem — seu respeito à natureza (a conexão com a floresta e demais animais) é amplamente distinto do modo de vista moderno, que é rápido, destrutivo e consumista — contraria o ideário dos demais. A mortandade dos indígenas tende a diminuir, no governo de Lula da Silva — cuja linguagem não é meramente economicista, mas não escapa às ideias de progresso acelerado —, mas certamente persistirá (torço, na verdade, para que o problema seja estancado). Sem Bolsonaro, quem vamos culpar? O poema “À espera dos bárbaros”, de Konstantinos Kaváfis, é um alerta para todos nós.




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